sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Suécia transforma esgoto em combustível para carro


Planejando uma viagem de carro? Lembre-se de ir primeiro ao banheiro. A cidade de Gotebörg está entre as dezenas de municípios da Suécia equipados com sistemas que transformam eflúvios de esgoto em biogás, em volume suficiente para operar milhares de carros e ônibus.


Os carros que utilizam biogás criaram sensação quando foram lançados em larga escala, cerca de uma década atrás. As emissões de gases de escapamento eram virtualmente inodoras, o combustível é mais barato que a gasolina e o diesel, e a idéia de recuperar energia com base em dejetos era atraente para os suecos, um povo que aprecia a ecologia.

"Quando você vai ao banheiro de manhã e alguma coisa de bom resulta disso, é fácil se deixar encantar pela idéia - é como uma utopia", disse Andreas Kask, consultor de negócios e motorista de táxi em Göteborg. "Mas na prática a coisa não funcionou assim tão bem por aqui".

Os motoristas se queixam do baixo número de postos de abastecimento, e de que os tanques dos carros só comportam biogás suficiente para duas ou três horas de uso. Alguns afirmam, além disso, que os modelos iniciais de carros movidos por biogás custavam a pegar nas manhãs chuvosas e que o espaço dos porta-malas era reduzido em função dos volumosos tanques necessários.

Os críticos também questionam a sustentabilidade da tecnologia, porque alguns dos sistemas utilizem os mesmos gasodutos que conduzem gás de cozinha às residências dos consumidores, o que gera mistura dos dois combustíveis.
Dois anos atrás, a Volvo, empresa sueca controlada pela Ford Motor, anunciou que suspenderia a produção de seus modelos movidos por biogás, e se concentraria em lugar disso na fabricação de veículos de baixo impacto ambiental acionados por uma mistura de gasolina e etanol. "Não vendíamos carros em número suficiente", disse Maria Bohlin, porta-voz da Volvo, em referência aos modelos acionados por biogás. "Talvez venhamos a reconsiderar a produção de carros acionados por biogás um dia, mas o momento ainda não chegou".

Desde que a Volvo decidiu deixar de lado a tecnologia do biogás, o uso do etanol avançou no mercado sueco, a despeito das críticas de que ele acelera o desflorestamento e influencia na elevação dos preços dos alimentos. Feito de açúcar e de grãos, o etanol também é vendido por um pouco menos que o biogás, em Gotebörg, ainda que os proponentes do biogás afirmem que seu combustível oferece quilometragem muito superior.

Goran Varmby, um funcionário da Região de Negócios de Gotebörg, uma organização sem fins lucrativos que promove o comércio e a indústria na região, disse esperar que a Volvo retomasse a produção de veículos movidos por biogás. "Mas existem muitos interesses econômicos fortes por trás do etanol", afirmou Varmby. Ele estava se referindo aos generosos subsídios que agricultores e produtores de biocombustíveis europeus recebem na Europa e nos Estados Unidos pelo cultivo e processamento de safras que permitam a produção de combustíveis.
Quimicamente, o biogás é igual ao gás natural produzido como combustível fóssil, mas sua produção depende de um processo sob o qual bactérias se alimentam de matéria fecal por cerca de três semanas em uma câmera sem oxigênio. O resultado é uma mistura de dois terços de metano e um teço de dióxido de carbono, além de um resíduo rico em nutrientes que pode ser usado em fertilização ou como material de construção.
Depois que o metano é filtrado, ele é bombeado pela rede de gasodutos de Gotebörg e chega a postos de abastecimento especializados, onde é pressurizado para venda. Qualquer carro com um motor e tanque configurado para uso de gás natural comprimido pode usar biogás.
Depois de cada abastecimento, um volume correspondente de biogás é injetado na rede municipal de gás natural para compensar a venda, disse Bo Ramberg, presidente-executivo da FordonsGas, sediada em Gotebörg, que opera a maior cadeia de postos de abastecimento de biogás na Escandinávia.

A idéia é que o volume de gás utilizado pelos veículos seja compensada pelo gás produzido com dejetos orgânicos. Ramberg, que foi executivo da Volvo, diz ter deixado a empresa cerca de uma década atrás criar a FordonsGas ao perceber uma oportunidade de promover a infra-estrutura necessária a entregar biogás aos motoristas. "Pretendemos certificar as emissões de todo o ciclo de produção e uso do biogás", dise Ramberg.
"Mas já acreditamos firmemente que o biogás seja o melhor combustível em termos de baixo volume de emissões", acrescentou ele. "Isso ninguém discute".
A FordonsGas, controlada parcialmente pela Dong Energy, uma companhia dinamarquesa, realiza pequenos lucros a cada ano, e continua a investir em novos postos de abastecimento de biogás, diz Ramberg.
Os defensores do biogás reconhecem que a decisão da Volvo de suspender a produção de veículos movidos pelo combustível representa um sério revés para a tecnologia. Mas eles afirmam que a decisão da Mercedes e da Volkswagen de lançar novos carros movidos por biogás no mercado sueco, este ano, e os incentivos fiscais e descontos oferecidos aos compradores desse tipo de veículo, podem estimular a venda de carros e do combustível.

O biogás como combustível para veículos está disponível também na Suíça, França, Alemanha e Áustria, mas a Suécia é o principal país usuário na Europa, de acordo com Irmgard Herold, analista da New Energy Finance, de Londres.

Ole Frederiksson, engenheiro da Gryaab, a estação de tratamento de esgotos de Gotebörg, diz que o usuário médio lança ao esgoto a cada ano biogás suficiente para dirigir 120 quilômetros.
"Caso o preço do petróleo continue em alta, e as pessoas se disponham a pagar mais por energia renovável, isso interessaria nossa empresa em produzir mais biogás", ele afirmou. "A capacidade existe".

Tradução: Paulo Migliacci ME

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